A decadência da Ciência americana

No dia 8 de novembro de 2016, realizaram-se as eleições para eleger o 54º Presidente dos Estados Unidos da América. Num resultado pouco, ou muito, esperado elegeu-se Donald J. Trump, do Partido Republicano, com 55.7% dos votos, derrotando-se assim Hillary Clinton, candidata do Partido Democrata. O candidato eleito tomou posse como novo líder do governo americano no dia 20 de janeiro de 2017.

Desde o primeiro dia à frente da Casa Branca, Trump tem-se mostrado pouco ou nada preocupado com questões que não estejam diretamente relacionadas com a esfera económica do país, tendo mesmo tomado medidas, pouco razoáveis em relação aos serviços de saúde, imigração, educação, apoio à ciência e tecnologia, e preocupação com o meio ambiente.

Em relação à (des)proteção do ambiente, uma das principais medidas que põem em causa a já frágil estabilidade das condições climáticas mundiais, foi a nomeação de Scott Pruit, um conhecido oponente de Barack Obama nas políticas ambientais, para liderar a Environment Protection Agency (EPA). Esta nomeação permitiu assim o apoio, em grande escala, de medidas, comprovadamente prejudiciais ao ambiente. Entre estas conta-se o abandono pelos EUA do Acordo de Paris, assinado por mais de 190 países em 2015 e que limitava a emissão de gases poluentes para a atmosfera. Também a cedência de um maior número de terrenos para exploração petrolífera e mineração em território americano, levou à denigração do património histórico e cultural dos nativos norte-americanos, o que mostra a clara tendência de apoio de Trump para com a indústria petrolífera e de carvão. Um outro exemplo de políticas de não-proteção do meio ambiente, é a destruição do património americano após a abertura do Alaska’s Artic National Wildlife Refugee para exploração petrolífera. O corte de financiamento de programas de proteção ambiental e a desregulação da quantificação de emissões em centrais produtoras de energia são mais tantos exemplos das políticas adoptadas pela administração Trump.

Na saúde, deu-se a tentativa de exclusão do Affordable Care Act, também conhecido como Obamacare, quase imediatamente após a entrada do novo presidente na Casa Branca. Não tendo conseguido que esta proposta fosse aceite, em outubro de 2017, foi aprovada uma lei que restringia os subsídios de apoio a indivíduos com baixos rendimentos na prestação de serviços de saúde, levando a que um subsidiário tenha de, para um mesmo serviço de saúde, pagar uma maior quantia. Devido à enorme privatização dos serviços de saúde nos EUA, muitos indivíduos terão uma maior dificuldade no pagamento dos serviços que necessitam.

No mundo tecnológico, Ajit Pai foi nomeado como chairman da Federal Communications Comission (FCC). Em dezembro, esta comissão votou a favor do abandono da política de Net Neutrality, permitindo aos serviços fornecedores de Internet bloquear ou diminuir a velocidade de alguns sites, consoante os planos de internet escolhidos pelos clientes.

No campo do ensino tentou-se aprovar uma lei que removia os subsídios do estado às instituições universitárias americanas, tornando apenas possível para os mais abastados frequentar o ensino superior. Esta lei não foi aprovada, no entanto verificou-se o aumento dos custos de acesso ao ensino superior.

Na ciência, a administração Trump limitou a entrada e dificultou, grandemente, a estadia de pessoas provenientes de oito países do Médio Oriente, sendo seis deles países muçulmanos, levando a que cientistas desses mesmos países tenham uma maior dificuldade em comparecer em conferências ou participar em pesquisas nos EUA. Ainda, o Deferred Action for Childood Arrivals (DACA), programa que permitia a jovens, que viajaram ilegalmente para os EUA em criança, de permanecer no país e, que neste momento protegia quase um milhão de jovens de serem deportados, está em risco de ser desactivado. Muitos destes jovens são hoje estudantes nas mais diversas áreas.

Após um ano na liderança da Casa Branca, a administração Trump tem-se mostrado pouco, ou nada, preocupada com assuntos que não estejam diretamente ligados à esfera económica dos EUA. O boost na economia americana verificado no último ano provém, com certeza, das novas medidas económicas, mas também das que já estavam a ser implementadas por antigos líderes americanos. Como centro multicultural os EUA apresentam uma enorme capacidade de produção de novas tecnologias, tendo centros científicos e tecnológicos extremamente mais avançados que em Portugal, e em muitos locais da Europa, centros esses que foram formados através de um enorme investimento na investigação e na ciência em geral.

Mas não é só de contas que se faz um país!

As recentes políticas de “desapoio” aos mais pobres, o fecho das fronteiras para indivíduos provenientes de outros grandes centros tecnológicos mundiais, a dificultação do acesso ao conhecimento, e a destruição do património (que sempre foi defendido, ferozmente por qualquer americano) irão levar os EUA, a passos largos, a uma leva de emigração que resultará numa fuga de cérebros do país. Talvez possa ser comparável com a fuga de cérebros que ocorreu na Alemanha Nazi em meados do século XX e que levou grandes cientistas a emigrarem para os EUA. A história repete-se assim apenas por motivos diferentes. Mas, se durante o século XX, ocorreu um enorme crescimento económico nos EUA, foi em parte pelo uso adequado dos recursos científicos na criação de novas tecnologias com aplicação industrial, no avanço da medicina e ciência em geral. Estas novas tecnologias foram desenvolvidas com o apoio de imigrantes que tinham grande dificuldade em exercer as suas funções nos países de origem.

Políticas de valorização económica, por si só, permitem que, a curto prazo, se verifique um crescimento rápido, no entanto não é apenas de economia que um país vive.

Na Europa, conhecida por ser mais recetiva à multiculturalidade e ao desenvolvimento científico, já se começa a receber cientistas provenientes dos Estados Unidos que viram as suas pesquisas canceladas ou sem apoio. Após a ameaça de saída do Acordo de Paris pelos EUA, Emmanuel Macron, atual Presidente francês, emitiu um comunicado afirmando que os cientistas ambientais poderiam realizar as suas pesquisas em França tendo assim um maior acesso a apoios que nos EUA. Este tipo de medidas serão cada vez mais comuns na Europa, e provavelmente noutros grandes centros mundiais, levando ao afastamento do conhecimento dum centro, que outrora fora efervescente em ciência e tecnologia.

Talvez a administração Trump tenha um jogada na manga para combater este novo problema por eles criado, no entanto e mesmo que tenha, esta irá demorar bastante tempo a ser implementada, e entretanto, a fuga irá continuar.

 

Guilherme Frias

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